terça-feira, 30 de abril de 2013

Para Manoel

Para nós traças pintar é fazer poesia.
Para Manoel poesia é uma artesania, é dar formas aos sons das palavras.
Para nós fazer poesia é também brincar de dar forma às cores.
Para Manoel fazer poesia é ir aos deslimites das palavras.
Será que vamos escontrar os deslimites da nossa pintura?
Aprendemos com Manoel que podemos também fazer poesia e brincar com as palavras pensando em nossa pintura, em nossa vida de traças entrelaçadas, de traças curiosas, de traças cheias de dúvidas e incertezas.
Manoel chama poesia de desenho verbal.
Nós traças até agora só tínhamos desenhado com tinta e agora nos aventuramos a desenhar com o verbo. Bom brincar de traçar tintas e palavras, formas e harmonias, sons e cores.
Manoel diz que as imagens são as palavras que nos faltaram.
Para nós traças produzir imagens com as palavras que nos faltam é fazer poesia com as cores.
Manoel afirma que as coisas não querem mais ser vistas por pessoas razoáveis, elas desejam ser olhadas de azul.
Será esse o azul que nos ronda?
Obrigada Manoel por lembrar a nós o desenho com o verbo, a artesania das palavras, os deslimites das palavras e por nos lembrar também de não sermos razoáveis e continuarmos olhando as coisas de azul!



Estivemos por aí entre tintas, filmes e pensamentos. Assistimos o documentário Só dez por cento é mentira - A desbiografia oficial de Manoel de Barros e daí veio o texto de hoje. Quem não viu vá ver! 







quarta-feira, 24 de abril de 2013

As Traças seguem



Acrílico sobre tela 70x120 cm


Este é um de nossos primeiros trabalhos. 
É bom perceber um caminho percorrido e outros muitos que se apresentam.
Os azuis e verdes vivem nos rondando, com suas transparências e sua força.
A renda toma conta da figura e as traças seguem devorando formas, cores, luzes...
Cada vez mais entrelaçadas.









terça-feira, 23 de abril de 2013

O beijo

Depois de ler o que Mariana escreveu, de ver a sensibilidade com que descreveu o seu, o nosso processo e sua infância também lembrei da criança que fui. Impossível não lembrar. Creio que a característica de que mais me lembro e que é também a mais presente na Ana de hoje é a curiosidade. Olhava o mundo com  olhos famintos. E ainda o espio dessa maneira: como se existisse sempre um buraco de fechadura pela frente para descobrir novas e interessantes possibilidades sobre o que me rodeia e além. E assim como Mariana, também fui uma criança encantada com a arte. Fazia desenhos e cartas "artísticas" para aqueles que caíam em minhas graças. Muito cedo também me encantei pela arte da comida, para desespero de Lalá que, depois de minhas aventuras culinárias, ficava encarregada de organizar tudo. A dança foi o que primeiro levei a sério. Aos oito anos tinha certeza de que seria bailarina. Dançava nas aulas, nos palcos, em casa, nos corredores, nas lojas. Dançava a vida. Depois que o balé ficou no passado, a música entrou em cena. Cheguei a fazer parte de uma banda e me dediquei por um tempo a aulas de canto. E, embora não cante mais em público,  uma música certa, na hora certa ainda é capaz de salvar o dia. 
Mas hoje penso no que povoou minha cabeça na minha infância como artista plástica e o que primeiro me vem a lembrança é uma tela que conheci no início de minha formação  e que ainda considero uma das melhores: é o beijo de Klimt. Neste trabalho, o amor daqueles amantes perece transbordar e inunda o observador. A riqueza de cores e detalhes faz com que uma artista aficcionada pela cor como eu se renda ao desenho, as formas, à feminilidade que o autor imprimiu naquela tela. Pintado entre 1907 e 1908, é considerado  a obra prima do período dourado de Klimt. Sofre influência da Art Nouveau e presença de elementos orgânicos. Atualmente, está no Museu Österreichische Belvedere, em Viena.

Até logo.
Ana Pires.


O beijo ou Der kuss, Óleo sobre tela 180 X 180 cm


segunda-feira, 22 de abril de 2013

Hoje tem música!


Refletindo sobre nosso processo de trabalho, procurando escrever sobre ele naturalmente olhamos para trás. E a partir destas reflexões abrem-se novas perspectivas para o caminho a seguir. Já contei como as figuras surgiram em minha pintura, figuras que me instigam e invadem. Penso que estão cada vez mais suaves, apesar de seus gritos e ruídos...
Ana, minha parceira de traçados, falou de seu encontro com a renda ainda na infância e por isso resolvi ir um pouco mais distante. Fiquei pensando na criança que fui, curiosa, tímida, antiga e que anda por aqui em algum lugar. Quando penso nela, na minha criança, penso que a Arte sempre esteve comigo, o desenho, a música e o teatro me mobilizaram desde pequena. Depois de começar a ler e a escrever foram as palavras que entraram com força em minha vida. Não foi por acaso que meu trabalho no fim da faculdade juntou pintura e palavra. Penso que aqui continuamos essa mistura. Mistura de olhares, linguagens e processos.
A parceria que vivemos hoje é resultado dessas histórias, de nossas misturas, de tudo o que vimos e ouvimos, de tudo o que estudamos e aprendemos, e certamente de nossa vontade de continuar aprendendo sempre.
Aprendemos todos os dias em que estamos no ateliê discutindo cores e formas, sombras e luzes.
Aprendemos com as músicas muitas vezes presentes, ou mesmo com o silêncio que muitas vezes cai muito bem.
Aprendemos a cada olhar para uma janela, uma árvore, um passarinho. Aprendemos vivendo a cidade que nos cerca com o céu de um azul contundente.
Aprendemos com as pessoas, seus sons, toques, cheiros e gostos.
Todas essas coisas e cada uma delas alimentam as Traças que somos.
E depois botamos para fora em forma de pintura nosso jeito de perceber a vida.
Cada uma a sua maneira chegou até aqui trazendo suas bagagens e seus olhares. E tem sido assim nosso trabalho.
Espero que possamos acrescentar novos traços nesse caminho.
Depois de tantas palavras, deu vontade de postar uma música, coisa que muito nos alimenta. Pensei nessa música que pra mim além de som,  tem cor, cheiro, lindas palavras e lembra infância.
Inté! 

Mariana



sábado, 20 de abril de 2013

Memória e arte e vida e tal

Eu tava pensando, percorrendo os labirintos da memória... Foi numa disciplina de pintura. Deveríamos desenvolver uma pesquisa sobre o artesanato cearense. Pesquisar padrões de imagens de objetos artesanais e a partir daí criar pinturas abstratas. Descobri na renda de bilros desenhos que poderiam ser usados e comecei a pintar inspirada em suas tramas. Na disciplina seguinte  pesquisamos artistas, tendências, pensamentos para criar um projeto em pintura. O meu tinha como tema central a renda de bilros e a memória feminina. A partir daí estes dois elementos caminhariam juntos em minha produção artística por um bom tempo. Na época a minha memória foi também importante para a escolha deste tema. Me encantava na infância ver minha avó paterna fazer dançarem os bilros e, embalada pelos seus melódicos sons, ver os bicos de renda nascerem. Então as telas que criei tiveram o tempo como coadjuvante. Ficaram claras, desbotadas, gastas como os objetos expostos a passagem dos dias, dos anos. Renda e memória se confundem num turbilhão de sentimentos e histórias de mulheres que produziram e produzem renda, arte, vida. Minha memória e história estão presentes nos trabalhos desta fase de pesquisa de modo íntimo. Comecei a fazer trabalhos de grandes formatos. Me apaixonei por esses espaços que possibilitam que o ar circule, que a renda escreva, que a memória viva. Deixo hoje um desses primeiros trabalhos, quando comecei a namorar o universo das linhas que tanto  busquei entender enquanto dançavam nas mãos experientes de minha avó Nequinha.

Ana Pires.





Acrílico sobre tela 150 X 150






sexta-feira, 19 de abril de 2013

Figuras

Vou voltar um pouco no tempo e falar das figuras.
Essas figuras surgiram assim numa aula de gravura.
Foi experimentando fazer o rosto de uma mulher, retirando a madeira, retirando olhos, boca, nariz...
Faz tempo que andam comigo.
Não sei quem são, se as vejo por aí ou estão aqui dentro.
Gosto delas.
Muitas vezes sós, em outras duas, ou muitas.
Com diversas formas, gritos e cores.
Já foram de papel, de madeira, agora são de tinta.
Hoje são cobertas, entrelaçadas, aconchegadas e acolhidas pela renda.
São percebidas por outro olhar.
Olhar da amizade.
Olhar do encontro.
Encontro de traças.
Horas de conversa.
Horas de silêncio.
Tempo de trabalho.
Cansaço!
Satisfação!
E aqui estamos, nós e nossas figuras,
nós e nossas rendas, nós e nossas pinturas!


A ideia hoje é falar das figuras, e pensando nelas, no nosso trabalho essas palavras vieram. 

Como resolvi voltar no tempo vou postar hoje a imagem de um trabalho antigo que foi feito ainda na faculdade. É uma colagem, um dos primeiros trabalhos com as figuras.
Espero que esse seja um espaço de troca e que possamos mostrar um pouco do que acontece nesse encontro de traças!
Inté!

Mariana.





Técnica mista sobre papel





quinta-feira, 18 de abril de 2013

O encontro das traças

Depois do reencontro em Fortaleza pensamos, conversamos e decidimos arregaçar as mangas para fazer um trabalho juntas misturando olhares, conceitos e ações. Eu já pesquisava o universo da renda de bilros. E dele me alimento, como fonte de inspiração para criar imagens que se costuram, aqui, ao trabalho que Mariana desenvolvia desde a graduação. Numa disciplina de xilogravura, nasceram figuras que lembram perfis humanos e que podem simular ações, emoções e sentimentos. A esse trabalho demos o nome “traça”. Traça porque olhamos o inseto e percebemos que ele come quase qualquer coisa: papel, tecido, coisas novas e velhas. Traça é ainda o nome de um ponto muito comum na renda de bilros por ser muito parecido com ela. A forma do bichinho, por sua vez, aparece com frequência nas telas que a parceria gerou. Nelas criamos caminhos com as traças das rendas e dos perfis. Nos alimentamos mutuamente com ideias, formas e cores, que dão vida a traços peculiares que resultam em um trabalho feminino, com elementos que podem ser, ao mesmo tempo, atuais e de outras épocas. Ah, traça é também o feminino de traço! Neste blog, pretendemos compartilhar um pouco do nosso processo nessa empreitada e também mostrar os trabalhos que a aventura de pintar a quatro mãos tem produzido. Hoje começamos pelo começo! Postamos, então, a primeira tela fruto de nosso trabalho coletivo! 

Ana Pires.





Acrílico sobre tela 120 X 70 cm